TAO TE CHING
O LIVRO DO CAMINHO E DA
VIRTUDE
LAO TSE, o Mestre do Tao
Tradução e Interpretação do
Capítulo 7
do Tao Te Ching, de Lao Tse,
por WU JYH CHERNG
Transcrição e Síntese de Aula
Gravada na Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 19 de julho
de 1994
Capítulo 7
O céu é constante, a terra é
duradoura
O que permite a constância e a
duração do céu e da terra
É o não criar para si
Por isso são constantes e
duradouros.
Assim,
O Homem Sagrado deixa seu
corpo para trás e o Corpo avança.
Além do corpo, o Corpo
permanece.
Através do não-corpo, conclui
o Corpo.
No Capítulo 7, Lao Tse examina uma questão que faz parte do
questionamento das pessoas: a duração de tudo e de todas as coisas em relação
ao ser humano. O sol, a lua, a galáxia,
a própria Terra, todos têm uma durabilidade bem maior do que a do homem. Por que não podemos durar tanto quanto o sol,
a lua, as estrelas? O Capítulo 7 gira
exatamente em torno desse questionamento.
Ele diz:
O céu é constante, a terra é
duradoura
O que permite a constância e a
duração do céu e da terra
É o não criar para si
Por isso são constantes e
duradouros.
Há uma diferença entre a constância e a duração. A duração, apensar de ser um tempo longo, tem
um princípio e um fim. A constância
não. A constância não tem princípio nem
fim.
O céu simboliza o Vazio, o Yang do espaço. A terra simboliza a forma, o Yin da
matéria. Todas as matérias têm
forma. As matérias e as formas existem
no espaço dentro do Vazio. Dessa
maneira, o vazio do espaço é simbolizado como o céu e a matéria são as matérias
formais que existem dentro desse espaço.
No cosmos, as coisas funcionam assim.
Esse vazio do céu, vazio do espaço, esse espaço do céu, é
constante, não tem princípio nem fim.
Por isso, é Yang e o Yang é criativo, é a constante criatividade. A constante criatividade não tem princípio
nem fim e por isso se chama a Constante Criatividade.
Se uma criatividade tem um princípio e tem um fim, deixará de ser
uma constante criatividade. A Terra é
exatamente o fruto criado dentro dessa potencialidade chamada constância. A duração, portanto, está contida dentro da
constância.
A Terra, os planetas, as estrelas estão dentro do espaço. Como o Yin está dentro do Yang. Ou as formas estão dentro do vazio. A soma da forma com o vazio, a união do céu
com a terra forma então o cosmos e o universo.
Essa união se chama Tai Chi.
A arte marcial Tai Chi Chuan é inspirada no conceito do Tai
Chi. O Yin e o Yang estão em constante movimento. Trabalha-se todo o tempo com a integração da
energia Yang com a energia Yin, tomando-se a consciência da polaridade, dos
opostos. Também trabalha-se todo o tempo
a forma em relação ao espaço. Cada
movimento que se faz no espaço, traz a consciência não apenas do corpo como do
espaço. O espaço juntado ao corpo formam
o Tai Chi, a parte inferior do corpo juntando-se com a parte superior do
corpo. O movimento corporal e a mente,
unidos, formam o Tai Chi. A mente é Yang e o corpo é Yin; o lado direito é Yang e
o lado esquerdo é Yin; a parte superior é Yang e a parte inferior é Yin. O corpo é Yin e o espaço que abriga o corpo é
Yang. Trabalha-se todo o tempo com essa consciência.
O homem vive dentro da integração do universo. Há acima de nós um céu que pode ir até o infinito do universo e
abaixo de nós existe uma terra que pode ir até uma finitude. A terra é finita. Nós vivemos entre o finito da Terra e o
infinito do Céu. Apesar de vivermos
entre essas duas coisas, a nossa presença é temporária. A vida do homem é bem menor do que a finitude
da terra e menos ainda pode ser comparada à infinitude do céu.
Novamente surgem as questões: por que o céu e a terra duram e
permanecem tanto?
E como poderemos nós nos igualarmos ao céu e à terra para que
possamos ter a constância do céu e a duração da terra?
Dentro de nós existe a mesma potencialidade entre o Yang e o Yin
tanto quanto existe no universo a integração do Yang com o Yin.
Lao Tse, respondendo a estas questões, diz:
O céu é constante, a terra é
duradoura
O que permite a constância e a
duração do céu e da terra
É o não criar para si
Por isso são constantes e
duradouros.
O céu e a terra não criam nada para si. A razão do céu e da terra serem duráveis e
constantes é que a força primordial que os move, que mobiliza ambos, não é a
força do próprio céu nem da própria terra e sim a força do Grande Tao. Céu e terra são movidos pelo Tao. O Tao está em todas as partes, é o princípio
de tudo, está presente em todas as coisas.
É essa força do Tao, como o Absoluto, que move o céu e a terra.
A diferença entre o ser humano e o céu e a terra é que o céu e a
terra trazem dentro de si uma coisa chamada ‘naturalidade’. No céu e na terra todas as coisas acontecem
dentro de uma naturalidade: o céu e a terra não pensam, não premeditam. Eles emanam consciência, emanam força
energética, produzem movimentos físicos de uma maneira natural enquanto o ser
humano já perdeu, em sua grande parte, essa naturalidade. Nós agimos com demasiada intenção. Sempre tentamos produzir com nossa própria
mente, questionar com nosso próprio julgamento, com nossas próprias idéias,
ignorando a integridade do universo.
Vivemos a nossa vida consumindo a nossa própria energia e nossa própria
força enquanto esquecemos que existe uma energia cósmica que poderia estar nos
conduzindo em vez de nós estarmos conduzindo a nossa vida com a nossa própria
força. Precisamos aprender a permitir
que a força cósmica conduza nossa vida.
A natureza em consciência sem ego, energia sem ego, movimento
físico sem ego. Você já imaginou se o
sol tivesse um ego tão forte quanto o nosso?
Também a Terra não tem ego. A
Terra não pode decidir deixar de girar, por exemplo. Bem como o sol, não pode recusar doar sua luz
aos planetas. Tudo acontece
naturalmente, sem intenção.
No caso do homem, ele usa sua intenção para conduzir os eventos: o
ser humano complica a sua vida ao ponto de perder a própria naturalidade. Essa perda da naturalidade faz com que as
nossas vidas não tenham mais constância e duração: que não sejam constantes e
duradouras, como o céu e a terra.
Os mestres iluminados ou ascensionados são exatamente aquelas
pessoas que conseguiram de alguma maneira recuperar essa constância e essa
duração. Dependendo do grau de
recuperação dessa naturalidade e integração entre o céu e a terra, eles se
tornam ascensionados de um nível mais alto, mais amplo e profundo, ou menos
alto, menos amplo e menos profundo.
A continuar permanecendo como estamos, nos tornamos sempre os
mesmos: vivendo, morrendo, vivendo, morrendo.
E ainda podemos piorar mais ainda essa condição, migrando para níveis
inferiores.
O Taoísmo busca, portanto, essa recuperação dessa integração da
naturalidade. O primeiro passo dessa
jornada é a não-intenção. Não-intenção não
deve ser entendida como não fazer nada.
Quando o Taoísmo fala do famoso conceito da não-ação, deve ser entendido
como ação-não-intencional. Uma ação que
seja, pelo menos, menos intencional. Não
se deixa de fazer as coisas. O que deve
ser feito será feito, apenas que feito de uma maneira mais natural, de uma
maneira mais espontânea, menos premeditada e menos engenhosa, com menos
ego. Isso não significa que
renunciaremos a nossa capacidade mental, racional, intelectual, física e
energética. Não. Temos plena consciência das cosias apenas que
usufruímos delas de uma maneira mais natural, mais espontânea, mais suave. Isso é chamado de ação-não-intencional. As pessoas não perdem o pensamento, a
capacidade de pensar, de sentir, de sensibilizar-se, porém não são prisioneiras
da sensibilidade, do pensamento, de quaisquer capacidades.
Os animais são mais espontâneos do que os homens. E menos disciplinados em relação aos
instintos. Porém o animal não possui uma
complexidade racional e uma complexidade emocional como o ser humano. O ser humano possui uma múltipla capacidade,
como se fosse uma máquina bem mais sofisticada.
O espírito primordial - que é o espírito universal que existe na
essência de cada ser - é igual tanto para o animal quanto para o homem. A alma que envolve a transfiguração desse
espírito é que tem uma intensidade diferente, carregando dentro de si todos os
códigos e todo o constante processamento e as modificações. Quando essa alma entra dentro de um corpo,
dependendo do grau de sofisticação, o aproveitamento dos dados é
diferente. O espírito de cada um de nós
é como se fosse um disquete de computador, virgem, potencialmente
infinito. A alma é como o sol. O programa sofisticado e complexo gravado e
colocado numa máquina de alto potencial funciona de uma maneira diferente da de
um mesmo programa colocado numa máquina de menor intensidade. O corpo dos animais dispõe de uma capacidade
menor do que o corpo de uma alma encarnada humana. A diferença entre o disquete e a alma é de
que o disquete não é moldável; quando inserido numa máquina de menor
capacidade, trabalha conseqüentemente muito menos.
A alma não é assim tão rígida, ela se amolda conforme o tempo que
passa numa potencialidade limitada, se enquadrando no nível daquela potencialidade
e a partir daí, as encarnações vão acontecendo em níveis mais inferiores - o
que é denominado de ‘caminho da obscuridade’.
Do mesmo modo, a alma de um animal pode reencarnar num ser humano,
ampliando sua programação e melhorando aos poucos, também.
Nessa infinitude de encarnações, a alma está todo o tempo se
moldando e esse é um dos conceitos fundamentais do I Ching, a
mutabilidade. O tempo inteiro tudo está
mudando. O corpo muda, a alma muda, o
conceito muda, a capacidade da consciência muda.
O Taoísmo não trabalha com os conceitos de evolução e de
involução. Também não trabalha com os
conceitos de castigo e punição. Você fez
o seu destino até o ponto anterior que fez com que você hoje seja assim. Continuando a viver progressivamente a sua vida,
você vai fazer com que sua(s) próxima(s) vida(s) seja(m) o resultado daquilo
que você fez até lá.
Portanto, não existe um juízo supremo que faz um julgamento. Se um ser humano encarnou num animal, ele
criou essa situação para si mesmo, ele se transformou num animal. Ao contrário, se um animal se transformou num
ser humano, ele também fez por isso. Se
após um longo tempo de vivência, um homem se tornou uma divindade em nível
superior, tornou-se uma divindade celestial num mundo mais sutil e mais iluminado,
ele fez por isso.
Se existe evolução ou involução, isso é uma questão de
semântica. No Taoísmo, não existe o
chamado conceito de evolução espiritual onde acredita-se que as pessoas podem
progressivamente ir se desenvolvendo até chegarem à perfeição.
Uma divindade pode retornar ao nosso mundo como mestre. Volta e meia existem pessoas do reino
celestial encarnados na Terra por motivos diferentes. Podem também migrar para uma outra dimensão
que não seja humana, migrar para outros mundos.
No Taoísmo, quando das mudanças de dimensão ou de encarnação, não existe
uma decisão pragmática do homem. Ele
apenas faz, apenas constrói sua vida.
Dois mais dois são quatro e pronto.
Não pode ser diferente. As
mudanças vão simplesmente acontecendo, sem que haja qualquer juízo sobre isso.
No caso de descenso de pessoas já em níveis superiores, existem
dois tipos: aqueles que por matemática somaram 5 a -2 e obtiveram 3. E aqueles que por voto próprio de compaixão,
descem como trabalhadores. Eles vêm
ajudar e depois retornam. Podemos
perguntar se eles têm consciência disso.
Alguns sim, outros não, dependendo do nível da pessoa e dependendo do
nível do espírito encarnado.
As divindades não necessariamente são imortais. Há o conceito interior de divindades comuns e
divindades imortais. Imortais são
aquelas divindades que têm uma autonomia maior.
Existem inúmeros reinos, mundos superiores ao nosso nível que ainda
estão dentro do universo. O Imortal é
aquele que rompeu a fronteira do universo e foi para o mundo Wu Chi. Todas as divindades que estão dentro do mundo
do Tai Chi estão no mundo do Um. Os
Imortais foram para o mundo do Zero, o mundo do Wu Chi. Dentro do mundo do Tai Chi existem trinta e
três céus, ou seja, existem trinta e três níveis de universos no mundo sagrado.
As bênçãos vêm através do merecimento, não de forma gratuita. Uma divindade, por votos de afetividade e
compaixão, pode estar o tempo todo trabalhando em benefício das pessoas. Essa divindade pertence a um nível mais
baixo, mais próximo ao de nosso mundo.
Mas mesmo essa ajuda só pode acontecer no momento em que estamos
sintonizados com ela. Palavras como
merecimento, bênção, julgamento, etc, são perigosas de serem usadas por
trazerem idéias distorcidas. Essas
coisas não existem no Taoísmo. É
simplesmente uma questão de causa e efeito.
O crescimento e a conscientização são processos graduais. É preciso mudar uma série de hábitos e
costumes deturpados e a vida do ser humano é sempre tão curta, 60, 70, 80
anos. Às vezes, levam-se quinhentos,
seiscentos, mil anos para mudar alguns fragmentos... Tecnicamente falando, dentro de uma só vida,
a mudança torna-se muito difícil, o tempo é muito pouco e é preciso um enorme
esforço.
O Taoísmo propõe esta mudança, mas não através de se consertar
pedaço por pedaço. O Taoísmo propõe que
a pessoa se ‘esqueça’ de todos esses detalhes de falhas e coloque sua
consciência diretamente no Vazio novamente.
Desse modo, dentro desse Vazio, ressurgirão a nova alma e a nova
consciência de forma íntegra, inteira.
Somente a partir desse Vazio é que nasce naturalmente a força para
consertar a alma e não da tentativa intencional de mudar a consciência.
Quanto maior o grau de mudança da consciência, maior o grau de
modificação do Karma - do empreendimento da pessoa. No entanto, como conseguimos mudar muito
pouco, conseqüentemente também nosso Karma muda pouco.
Existem vários tipos de modificações da consciência. Uma pessoa denominada mestre espiritual,
sacerdote famoso, grande pensador ou homem virtuoso pode, muitas vezes, através
da mudança de sua consciência, varrer uma boa parte dos efeitos, ou seja, dos
vícios que traz num nível mais sutil, no nível do pensamento, no nível da
emoção, no nível mais energético. Mas
também muitas vezes não consegue varrer partes mais densas ligadas ao dinheiro,
à matéria, à situação social...
Teoricamente falando, é possível varrer tudo isso.
Os grandes mestres ascensionados são o exemplo das pessoas que
conseguem varrer todos os seus Karmas de uma só vez. Também eles podem renascer com defeitos
físicos, emocionais, mentais - embora isso seja bastante raro. Teoricamente falando, os grandes mestres
conseguem alcançar uma modificação completa, uma grande transformação alquímica,
varrendo todos seus Karmas, tornando-se outros seres com saúde física,
emocional e mental. Principalmente saúde
espiritual. Tudo isso é muito difícil,
tecnicamente falando.
O Karma pode ser transformado dinamicamente através de seu débitos
e créditos numa transformação espiritual.
Na história do budismo Mahayana, havia um discípulo entre os 16
discípulos de Buda, que era considerado aquele com maior poder mágico. Antes mesmo de ele se converter ao budismo,
já era um grande tantrista que voava, desmaterializava-se e tinha poderes de
derrotar um exército inteiro com sua força mágica. Dizem as lendas que anteriormente, ele já
tinha vivido várias vidas como um homem muito poderoso. Embora tivesse tanto poder, ele não conseguiu
escapar da morte física violenta, sendo trucidado em pedacinhos... Outro discípulo indagou ao Buda por que
aquilo tinha acontecido a aquele irmão tão poderoso e o Buda respondeu que,
apesar de toda uma transformação da consciência, existiu uma parte que não
conseguiu se modificar e o destino teve que ser cumprido. Aquele homem não havia conseguido dissolver
aquela parte. A partir do momento que o
corpo do discípulo foi trucidado totalmente, houve uma dilatação espiritual,
uma entrega. Obviamente, o budismo traz
aquele conceito de desapego ao corpo físico.
Hoje em dia, encontramos menos mestres espirituais tão poderosos
quanto aqueles lendários da antiguidade.
Nosso mundo hoje não traz uma condição tão favorável para o
desenvolvimento de uma pessoa - muita poluição, muito som, muito barulho,
muitas ondas elétricas e eletrônicas.
Devido a essa nossa redução de capacidade, estamos mais descrentes, mais
céticos e não acreditamos naqueles textos sagrados da antiguidade que narravam
sobre levitação e vôo dos mestres espirituais.
Hoje, na leitura dos textos, as pessoas vão buscar suas considerações
psicológicas e simbólicas tentando provar coisas através dos entendimentos
psico-simbólicos atuais.
Quando se trata dos mestres tradicionais que honram a Tradição, ao
fazerem a leitura dos textos de alquimia, de magia, etc., eles não fazem
leitura psicológica e sim lêem os textos da forma como foram escritos: os
textos simbólicos são lidos como textos simbólicos, a história é lida como
história.
Existem, realmente, textos escritos em linguagem figurada, em
códigos, em linguagem simbólica. Nesse
caso, assim se faz para manter o ensinamento em condição hermética, para que
não seja revelado a qualquer um, simplesmente, de qualquer maneira. A linguagem, então, é transformada em
linguagem de código, simbólica.
Os mestres antigos, entretanto, tinham realmente uma maior
capacidade de realização. Hoje em dia,
vêem-se muitos mestres que, apesar da modificação da mente, da consciência, da
emoção, ainda não conseguiram escapar a uma série de problemas físicos,
ambientais, muitas vezes materiais, dificuldades financeiras, de saúde, etc.
Lao Tse, em outro Capítulo do Tao Te Ching, diz assim:
O Tao gera o Um
O Um gera o Dois
O Dois gera o Três
E o Três gera todos os dez mil seres, as dez mil coisas
Todas as coisas nascem do Três, o Três nasce do Dois, o Dois nasce
do Um e o Um nasce do Tao. Se você
transformar isso em matemática, verá que os dez mil seres vieram do Três, o
Três veio do Dois, o Dois veio do Um e o Um veio do Tao. O Tao é Zero.
O Zero é o Absoluto que abrange tudo. Se o Três veio do Dois, o Dois veio do Um e o
Um veio do Zero..., então o Um está dentro do Zero e todos os outros números
estão dentro desse Um.
Existem infinitas leituras e dentre estas, na leitura pura do I
Ching, o Um é o Tai Chi, o Dois é o Yang e o Yin , e o Três é o céu, a terra e
o homem. Pode-se dizer, então, que o Um
é a unidade, o dois é a polaridade e o três, o equilíbrio. A integração entre as polaridades traz o fruto
extraído dessa integração que é o terceiro elemento entre os dois e assim
gerando todas as coisas. Tudo vem a
partir do Três, por isso a trilogia acontece em todas as tradições místicas.
Porque o céu e a terra conseguem ser constantes e duradouros e por não se criarem e serem sem-intenção
própria e sem meta própria, deixam suas vidas, suas existências serem
conduzidas por uma grande energia única que é o Supremo Uno oferecido pelo
próprio Tao. É, portanto, a própria
unidade de energia Una que existe no céu e na terra que faz com que o céu não
se separe da terra e a terra não se separe do céu. Isso é a grande energia do Uno que abraça
todas as coisas. Se o homem consegue ser
como o céu e a terra, recebe essa energia Una.
Por ser possível que o homem se torne constante e duradouro, em
seguida Lao Tse nos diz:
Assim,
O Homem Sagrado deixa seu
corpo para trás e o Corpo avança.
Imagine que você está dentro de seu corpo, você avança mas seu
corpo fica para trás, o que então acontece?
Você entra no Vazio.
“Deixar
o corpo para trás”
também pode ser entendido de uma maneira mais liberal, mais poética. Na verdade, somos muito apegados à nossa
forma e dificilmente deixamos nosso corpo para trás. Nós achamos que somos esse corpo. Essa forma, no entanto, está o tempo todo
mudando, envelhecendo, piorando de saúde, melhorando de saúde, ficando triste,
ficando alegre... A partir do momento em
que nossa consciência acha que somos isso - esse corpo - nós somos a
impermanência do ser porque nosso corpo é a maior revelação da impermanência do
ser. Nós vemos a impermanência a cada momento. No momento em que nossa consciência é
pressionada pelo corpo, a consciência torna-se uma consciência de
impermanência. Estaremos, então, vivendo
todo o tempo a vida e a morte, a vida e a morte. A cada instante é a vida; a cada instante é a
morte. A cada instante estamos
descobrindo um novo nascimento, a cada instante estamos descobrindo a morte.
E Ele continua:
Além do corpo, o Corpo
permanece
Mestre Maa, nosso mestre, dia que para você carregar uma xícara de
chá, você tem que estar fóra da xícara para poder carregá-la. Se você estiver dentro da xícara, você não
vai conseguir carregar esta xícara. Se
você quiser carregar o seu corpo, você não vai poder estar dentro dele. Se você quiser possuir seu corpo você não
poderá estar limitado por ele. Sem ser
limitado pelo corpo, você domina a forma.
Sem ser limitado pela forma, assim você pode dominá-la.
Na prática da Meditação Taoísta, basicamente existem cinco etapas
importantíssimas, cinco esquecimentos que são conceitos da Alquimia
Superior. A Alquimia Taoísta possui três
níveis: Superior, Mediano e Inferior.
Esses cinco esquecimentos trazidos pela Alquimia Superior nos
foram revelados pelo nosso Mestre Maa e são ensinamentos importantíssimos e
preciosos. Eles são: CORPO, SOPRO,
ESPÍRITO, VAZIO, VERDADE.
Corpo é corpo; Sopro é energia; Espírito é consciência. Vazio e Verdade são mais difíceis de
entender. Normalmente, a consciência da
pessoa está condicionada no corpo, ou seja, as pessoas são limitadas por seus
níveis sensoriais e formais. Do sentido
e da forma não conseguimos emitir uma só frase sem que ela contenha uma idéia,
uma forma. Não conseguimos comer alguma
coisa sem que lhe adivinhemos o sabor.
Isso é o sentido, o sensorial.
Portanto, tudo o que vivemos está condicionado no nível do sensorial e
da forma.
Na prática da Alquimia Superior - prática de meditação -, o
primeiro passo é esquecer o corpo. Não é
brigar com ele, anulá-lo, e sim, esquecê-lo.
É preciso esquecer o corpo para se poder atuar no Sopro.
Na prática da meditação, o primeiro estágio - que se leva anos para
ser alcançado - é o de inicialmente se colocar o corpo imóvel, depois se relaxa
da cabeça aos pés, de cima para baixo. A
partir daí, é preciso esquecer o corpo não se colocando a atenção e a consciência
no corpo e sim na respiração, no Sopro.
Quando não se sente mais o corpo físico ou se realmente o corpo físico
foi esquecido, nesse momento a consciência vai estar atuando no nível do Sopro. A consciência, então, torna-se outra, mais
diluída, menos compacta, menos rígida. A
consciência torna-se uma consciência energética.
Basicamente, é isso o que tentamos fazer em nossa meditação.
Após bastante tempo dessa prática, bastou se sentar que não mais se
sente o corpo, entra-se num estado como se estivesse boiando dentro de uma
piscina sem corpo físico. Entramos
dentro de uma imensa energia, nós somos a própria energia, lenta, gostosa. Apenas que isso não é a realização. Isso é apenas o resultado do primeiro esquecimento:
não existe mais corpo, nós somos o Sopro.
No segundo estágio, é preciso esquecer o Sopro. Havia uma consciência integrada ao corpo
físico sendo portanto limitada pelo
corpo físico. Esquecendo o corpo físico,
ingressa-se num nível mais sutil, mais energético de ser: a consciência do Sopro. Também nesse momento se é limitado por esse
nível de energia, pelo universo da energia.
O universo, a dimensão física, já não mais nos limita; no entanto,
a dimensão energética, sim. a
consciência está aprisionada pela energia.
Entra-se então, no segundo estágio da Alquimia: esquecer a energia do
mesmo modo que se esqueceu o corpo físico.
É preciso se sentar e meditar, esquecendo-se o corpo e também a
energia. Nesse momento, a consciência é
uma pura consciência, somos apenas um espírito que não tem qualquer energia
para aprisioná-lo. Chegando nesse
estágio, nós somos pura luz.
Sentamo-nos em meditação e imediatamente ingressamos numa imensa
piscina, sem corpo. Em seguida, a
piscina desaparece e somos apenas uma imensa luz, a própria luz que está em
toda a parte. Somos
pura luz. Sentimos essa luz.
Somos muito irradiantes. Então,
se atingiu o terceiro passo.
Estamos iluminados, sim, mas não estamos no último passo da
Alquimia. É preciso que esqueçamos o
Espírito. Isso é muito mais difícil. Esquecemo-nos como Espírito e ainda
esquecemo-nos como Espírito de Luz, puro, sem forma, sem cor: somos uma imensa
luz como a luz do sol. Também isso deve
ser esquecido.
Senta-se em meditação e, em alguns minutos, não se sente mais o
corpo e em outros segundos, não se sente mais energia e mais alguns segundos,
nos tornamos uma imensa luz e também essa luz desaparece e sentimos um imenso
Vazio.
Nesse momento, todas as luzes, todas as energias, todos os corpos,
o universo inteiro está dentro de nós porém o universo inteiro não é você nem
sou eu. Somos exatamente aquele Vazio
que abraça todas as coisas. Talvez não
consigamos sentir isso, apenas uma anulação da luz, do Espírito e o ingresso
numa espécie de Vazio que abraça todas as coisas. Talvez não consigamos sentir isso, apenas uma
anulação da luz, do Espírito e o ingresso uma espécie de Vazio, uma profunda
quietude. Um Vazio Absoluto.
Chegou-se finalmente ao Absoluto?
Não.
Aí se encontra o quarto passo que se abre para o quinto estágio que
é dificílimo: quebrar o Vazio. Já
quebramos o corpo físico, já rompemos a barreira da energia, também rompemos a
barreira da consciência e finalmente, atingimos o Vazio. Agora temos que romper a barreira do Vazio.
Romper a barreira do Vazio, quebrar o Vazio, significa quebrar
aquilo que não se tem, que não existe; romper com algo que não se possui. Este estágio do Vazio significa, na verdade,
quebrar o que não se tem. Nós tínhamos a
nós mesmos e isso foi quebrado. Tínhamos
nosso corpo, a energia, o espírito e tudo foi quebrado e não existem mais
corpo, mais energia, mais espírito.
Somos o Vazio e temos que quebrar o Vazio.
A partir do momento em que se quebra o Vazio, retornamos a ser a
Verdade. Nessa hora, estamos em toda a
parte e estamos em lugar nenhum. Nessa
hora, chegamos a ser o Tao.
Esses são os Cinco Passos da Alquimia Superior. São cinco estágios estruturados por quatro
esquecimentos. Isso não é feito de um
dia para outro. Se conseguirmos passar
do Corpo para o Sopro - que é o primeira estágio -, já é maravilhoso. Se conseguirmos chegar ao nível do Espírito,
provavelmente seremos aquelas pessoas irradiando luz, muita luz, com muitos
discípulos. A partir do momento em que
entramos no Vazio, nos tornamos aquele mestre que desaparece do mundo. A partir do momento em que ingressamos na
Verdade, estamos presentes em toda a parte.
Estaremos em cada partícula do universo.
Quebrar o Vazio é algo que se aprende somente quando se alcança
este estágio da meditação. Não se pode
quebrar o Vazio com algo que não seja o Vazio.
Também não se pode quebrar o Vazio com o próprio Vazio. Nessa hora, aparece a grande questão.
Não se queria a forma, mas se acaba caindo nela. Do Espírito para o Vazio, já é o estágio do
inimaginável. Nos três primeiros estágios,
ainda se consegue ter uma relativa linguagem.
Quanto mais voltado para o Corpo, mais linguagem. Do Vazio em diante não existe mais linguagem. Até o Espírito, pode-se medir qualquer medida
retrocedendo-a até alcançar o Um. No
momento que se chega ao Um, tornamo-nos a própria luz infinita, uma consciência
feito uma luz, atinge-se o Uno. Nessa
hora, somos onipotentes. Com a
onipotência e ainda encarnados,
provavelmente nos tornamos um grande mestre.
Seríamos o próprio Sagrado, o Uno, em pessoa.
Daí em diante, para entrarmos no quarto e no quinto passos,
teríamos que sair de qualquer medida. Os
instrumentos de medição, nesses casos, não funcionariam mais. Pode-se medir até o Um, em processo de
retrocesso, mas do Um para trás, não dá mais para se medir. Não se pode usar o finito para medir o
infinito. Não se pode usar a existência
para medir a não-existência. A partir
daí, não se ensina mais através das palavras.
Muitas vezes, a pessoa atinge o Um e fica aguardando durante muito tempo
o momento próprio para conhecer alguém que vá lhe dar essa Passagem. Porém, esse ensino, esse conhecimento, não é
mais repassado através das palavras ou através doe ensinamentos palpáveis, como
anteriormente foi feito.
Essa passagem do Um para o Zero e do Zero para a quebra do
Zero...............................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................
Nota da Transcritora:
Sincronicamente, aqui terminou a
fita de gravação desta aula.
Foi uma aula bastante longa,
acontecendo em sua primeira parte, o Canto do Incenso seguido de entoação do
Mantra e de Meditação. Foram gravadas,
em suas totalidades, duas fitas de 60 minutos.
Infelizmente, a segunda fita
interrompeu-se no momento em que se falava da impossibilidade do uso da
linguagem...
TAO TE CHING
O LIVRO DO CAMINHO E DA
VIRTUDE
LAO TSE, o mestre do Tao
Tradução e Interpretação do
Capítulo 7
do Tao Te Ching, de LAO TSE,
POR WU JYH CHERNG
Transcrição de Aula Gravada na
Sociedade Taoísta do Brasil,
Rio de Janeiro, em 19 de julho
de 1994
Transcrição e Síntese de
Janine Milward
A tradução dos Capítulos do
Tao Te Ching foi realizada por Wu Jyh Cherng,
do chinês para o português,
e foi primeiramente publicada pela Editora Ursa
Maior,
sendo hoje publicada pela Editora Mauad, São Paulo,
Brasil
Nesta mesma Editora,
encontra-se
a realização da publicação das interpretações de Wu Jyh Cherng
acerca os 81 Capítulos da obra máxima de Lao
Tse, o Tao Te Ching